O jurista Ives Gandra Martins, 85, acredita que as ações de ministros do STF fora da zona de competência do tribunal, segundo sua interpretação, têm gerado instabilidade que pode desembocar em uma intervenção pontual das Forças Armadas para resolver a disputa entre os Poderes.
Segundo ele, esse mecanismo está previsto no artigo 142 da Constituição. “Pela Constituição, se houver conflito entre os Poderes e um deles recorrer às Forças Armadas, quem repõe a lei e a ordem são elas”, diz Gandra ao Painel.
Ele define essa capacidade de ação das Forças Armadas como um “poder moderador” colocado pela Constituinte. Ele também diz que funciona como uma “force de frappe”, tal como definido no francês: uma força de dissuasão, para que os Poderes se resolvam para que as Forças Armadas não precisem fazê-lo.
Essa interferência, ressalta, é pontual e destinada a resolver um impasse entre Poderes, e não se trata de uma ruptura institucional, mas de uma “reposição da ordem”. Ele diz que o caráter dessa ação localizada não está detalhado na Constituição e, portanto, não se sabe exatamente como funcionaria na prática.
Nas redes sociais, apoiadores de Jair Bolsonaro têm compartilhado trecho de vídeo em que Gandra apresenta o argumento e têm pedido um golpe militar com base nele. Gandra diz que não consegue controlar as extrapolações que fazem de seu argumento, mas que as suas falas são justamente para alertar os envolvidos e evitar que o choque entre Poderes chegue a esse ponto extremo.
Gandra critica as decisões do ministro Alexandre de Moraes de barrar a nomeação de Alexandre Ramagem para a direção-geral da Polícia Federal e do ministro Luís Roberto Barroso de proibir a extradição de diplomatas venezuelanos durante a pandemia. Ele vê como invasões às competências do Executivo.
“O Supremo tem que ser um guardião da Constituição. Não pode ser legislativo positivo, não pode entrar nas competências de outros Poderes”. “Cada vez que vez que um Poder faz isso ele coloca em risco a democracia”, completa.
Gandra diz que considera Moraes e Barroso dois grandes ministros e que os admira, mas tem visões diferentes sobre a atuação do Judiciário.
“Barroso é um neoconstitucionalista, interpreta que cabe ao Judiciário ter essa participação mais ativa. Eu vejo diferente. É apenas a visão de um velho professor de direito”, diz.Folha de S.Paulo